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Esta obra foi selecionada pela Bolsa Funarte de Reflexão Crítica e Produção Cultural para Internet
 
 
 
 

 

 
:: Quem é quem » Atores» Silvio Fróes
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Quando tinha quatro anos, já vivia em camarim, coxia..., tudo por causa de tia Laurinha (Laura Botelho) e tio Romão (Romão Botelho), que era o marido dela - um canastrão, como ela mesma dizia. Ela foi uma excelente atriz. Morava no Cubango, onde existia o Centro de Melhoramento Pró-Cubango, do qual meu tio, Hamilton Alvarenga, era diretor social, e tia Gabi Alvarenga e minha mãe, Silvia Calheiros Fróes, eram diretoras do departamento feminino. Elas faziam teatro desde a infância, numa fazenda administradapelo meu avô materno, lá em Campos dos Goitacazes.
Tia Gabi tinha 7 anos de idade, mamãe, 15, e tia Celeste, 17. Tia

Celeste tocava piano,mamãe ensaiava e tia Gabi representava. O teatro que faziam era um teatro mambembe: o trem que transportava a cana-de-açúcar para a moenda era o mesmo que elas usavam pra ir de cidade em cidade apresentando suas peças. Como ainda eram muito jovens, todas elas eram levadas pelos pais.

Eu fiz teatro no Centro até a adolescência, quando dei uma parada para fazer Faculdade de Direito. Mas, quando estava no segundo ano, minha prima, Marilene Calheiros, estava fazendo pré- vestibular no colégio universitário na UFF, e me chamou para fazer parte do elenco de “Mãos Dadas”, com Haroldo Azevedo. A peça era uma coletânea de poemas de Carlos Drummond de Andrade.
Não teve jeito: depois desse espetáculo, fiz o Conservatório Nacional de Teatro, hoje UNIRIO, junto com a faculdade de Direito. Fazia Direito de manhã e escola de teatro à noite, mas trabalhava à tarde como funcionário público para agradar mamãe e para papai deixar que eu continuasse com as artes. Ele queria que eu me formasse na universidade. Ser ator, nem pensar! E o mais interessante é que meu pai é Fróes, primo de Leopoldo Fróes. Quer dizer, tanto de um lado da família, quanto de outro, a gente tinha essa coisa do teatro.

No Conservatório, conheci o Luiz Mendonça, quando fui fazer uma peça com Maria Teresa Amaral no Teatro de Arena da Guanabara, no Largo da Carioca. Era um teatro todo de tábua, e fiz “A Morta”, de Oswald de Andrade. Foi minha primeira peça profissional, em 1968. Lá o Mendonça me viu e me chamou para fazer “A Volta do Camaleão Alface” da Maria Clara Machado.

Com o grupo do Mendonça, a gente fazia tudo. Quem não estava atuando, estava na iluminação e até mesmo produzindo. A gente fez um curso completo de teatro com ele. Aprendi ali muito mais do que na escola. Com Mendonça, fiz “As Incelênças”, “Canção de Fogo”, e “Viva o Cordão Encarnado”, tanto no Rio quanto em São Paulo. Em São Paulo, ficamos no Teatro Aplicado, que hoje é o Teatro Bibi Ferreira. Morávamos no Teatro, que tinha quartos em cima, e que ficava na Brigadeiro Luis Antônio. Eu, Tonico Pereira, Elba Ramalho, Tânia Alves, Walter Breda... Viajamos pelo Norte e pelo Nordeste, por 15 capitais e três cidades do interior, durante 3 meses e meio, sem voltar ao Rio. O patrocínio era do INACEM, hoje FUNARTE.

Viajamos também com “Canção de Fogo” e “A Chegada de Lampião ao Inferno” - esta última com Madame Satã, que só fazia no Rio. Em viagem, quem fazia o papel dele era o Mendonça. Aprendi o que era viajar com o teatro. Algumas vezes, hotel cinco estrelas, outras, estábulos. Aprendi o que era mambembar.

Em 1989, fizemos “Rio de Cabo a Rabo”, teatro de revista no Rival, com 23 atores e cinco músicos. Uma loucura! Era uma cooperativa, e por incrível que pareça, ganhei muito dinheiro, arrebentou. Naquela época, os espetáculos eram de terça a domingo, com nove sessões por semana! Sábado, domingo e quinta, duas sessões. Folga, só na segunda, e isso durante 9 meses.

No “Rio de Cabo a Rabo”, tudo era artesanal. Todos ajudavam a fazer cenário e figurino. Íamos para casa do Mendonça bordar roupa! Essa montagem foi uma grande sacada dele, porque ninguém fazia teatro de revista como devia ser, e ele volta com um tema muito atual. Era muito engraçado, muito bem pensado, e também muito crítico. Foi uma grande parceria do Gugu Olimecha com o Mendonça, que dava todo o mote, enquanto Gugu passava para a carpintaria teatral. Os quadros eram escritos semanalmente, e assim que chegavam, a gente ensaiava. Foram seis meses de ensaios numa sala cedida no Shopping da Gávea. Até exercício de circo a gente fez.

Depois de “Rio de Cabo a Rabo”, fiz “Dancin’ Days”, novela de Gilberto Braga para Globo. Vivia de smoking, sempre tinha uma festa aqui, uma inauguração de boate ali, foi muito bom...! Nessa época, estava fazendo “O Bom Burguês”, em São Paulo, e a temporada acabou porque meu pai morreu aqui, em Niterói.
Depois disso, em 1982, por aí, fiz “Brasil Braseiro, o Jazz Brasileiro”, em Niterói. Era diretor e ator.

Até que, um tempo depois, aconteceu o Festival de Teatro Infantil, que fiz com os meus sobrinhos, cinco irmãos. A peça se chamava “Sonho Só Sonho”, e nós ganhamos o Festival. Dos dez prêmios, levamos sete!
Minha carreira é engraçada... Ela começa em Niterói, no Teatro da UFF, mas então vou para o Rio e me desligo completamente daqui. Mas, como eu disse, volto nos anos ’80, e vou ficando...

Em Niterói, nessa época, fiz “O Auto da Paixão de Cristo”, no Campo de São Bento, assistido por 4 mil pessoas, quando Leonardo Aguiar ainda era da antiga FUNIARTE, que hoje é FAN. Cristina Fracho era minha assistente. Dirigi essa Paixão de Cristo com 150 pessoas na equipe. Só de figurantes, eram 60! Foi uma loucura, porque nela trabalhavam quase todos os atores de Niterói. Ensaiávamos no Campo, de meia-noite às 5 da manhã, depois que fechava, e as pessoas ouviam tudo das varandas, porque era tudo gravado em estúdio. Essa montagem me marcou, e com certeza causou uma comoção geral.
Mesmo assim, a minha relação com o teatro em Niterói é meio distante. Atualmente, estou mais voltado para o ensino, até por uma questão de sobrevivência. Aqui em Niterói é tudo muito complicado. Mas não era assim. Eram tantos os espetáculos nesses anos ’80... O Teatro Leopoldo Fróes dava vez para todo mundo. A gente nunca deixou de ter espaço ali, ainda que fossem peças que ficavam só um mês em cartaz.

Lembro dessa década de ’80 ter sido muito fértil para o teatro de Niterói, mas ainda acho que a época da ditadura foi um marco da efervescência cultural na cidade. Quanto mais tentava abafar, mais se discutia, mais se brigava, mais se discordava, e mais fervilhava. Mesmo que cada um tivesse uma idéia, todo mundo se juntava e ia para os bailes, e montava seus grupos, e suas peças... Hoje, o teatro de Niterói está parado. É um marasmo. Parece que Niterói está andando de costas, porque hoje se politizou completamente o teatro na cidade. Virou politicagem. Antes, o teatro era nosso, estava em nossas mãos, o espaço era nosso. Quem não se sentia em casa no Leopoldo Fróes? Por isso que eu digo: existe uma diferença gritante entre “política cultural” e “politicagem cultural”...

Como eu disse, hoje estou dando aulas, lá na Oficina de Atores, e tentando montar um espetáculo. Em 2010, montei “O Gato de Botas”, no Rio, com os meus alunos dessa Oficina. Em Niterói, não penso em montar nada. Por quê? Ah... Porque a gente contribuiu muito pra isso aqui e todas as vezes que tentamos um movimento, que parece sério, no fim - e no fundo - continua a mesma coisa. Estou com 64 anos, sendo 40 de carreira, e não vou ficar usando a minha arte, que respeito pra caramba!, e em nome da qual deixei de advogar, pra ficar botando “azeitona na empada” de político. Não tem cabimento! Afinal, se eu não gostar de mim, se eu não prestigiar a minha arte, ninguém prestigiará.