DEMA,
o homem de teatro que foi o meu grande diretor.
Chegou ao Grupo Laboratório em 1970 pela via da militância política.
Já tinha tido uma pequena vivência de teatro junto ao Arena, em
São Paulo, além de ser apaixonado por cinema e por livros. Tinha
o hábito de assistir o mesmo filme várias sessões seguidas
no mesmo dia.
Dema entra no Laboratório como ator. Naquele mesmo ano, é preso
pela polícia da ditadura, levado para o DOI-CODI
(Destacamento de Operações
de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna)
e mantido sob tortura diária durante quase um mês, quando foi transferido
para o Hospital Central do Exército. Após assinar uma confissão
ideológica com a obrigação de se apresentar mensalmente,
durante dois anos, ao DOI-CODI, é liberado. Chega em casa ainda com as
marcas expostas da tortura.
Recuperado, volta ao teatro como ator. Após o afastamento de Gondim (José
Carlos Gondim), que era o maravilhoso diretor do grupo, assume a direção
dos próximos espetáculos. Neste momento, alguns atores traçam
novos caminhos na vida, afastando-se do Laboratório. Mas outros chegam.
Vivíamos uma época onde as discussões e os coletivos se
fortaleciam.
Dema era um ser político por opção, e contribuiu muito
para a organização dos que trabalhavam em teatro, não só
na cidade de Niterói, como no Estado do Rio de Janeiro e no Brasil. Organizava
encontros, assembléias, e foi uma presença fundamental na criação
de entidades como ATACEN (Associação de Trabalhadores em Artes
Cênicas de Niterói), FETIERJ (Federação de Teatro
Independente do Estado do Rio de Janeiro) e CONFENATA (Confederação
Nacional de Teatro Amador).
Nos anos ’70, a questão dos conceitos de “teatro amador”,
“teatro popular”, “teatro profissional”, passa a ser
muito discutida por muitos que faziam teatro. Tinha de tudo: teatro amador,
teatro estudantil, teatro independente, teatro experimental. E eram muitos os
grupos. A discussão dos conceitos passou a ser importante porque, na
época, as várias associações estavam sendo gestadas
e era preciso que os grupos se encaixassem em uma categoria que os unisse formal
e politicamente. O conceito de teatro independente se impôs como consenso,
substituindo, principalmente, o termo “amador”, que gerava muitas
polêmicas. Neste momento, o Grupo Laboratório muda o seu nome para
Grupo Independente de Teatro, afirmando o conceito independente e formando com
as iniciais a sigla GRITE. Dema foi o grande diretor do GRITE. E foram muitos
os espetáculos e as andanças por várias cidades do Brasil.
Grande amante da história e totalmente contemporâneo. O seu tempo,
o tempo presente, era a sua matéria de reflexão e construção
artística. Era um grande conhecedor da dramaturgia nacional e estrangeira.
Foi um pesquisador, gostava de garimpar textos.
De braços cruzados, sentado
numa cadeira no fundo da platéia... Assim ele assistia os ensaios. Era
de lá que regia o grupo, sempre com muita discussão, pois acreditava
na força do coletivo.
Vivia intensamente esses momentos de criação. Inquieto, sempre
em busca, caminhante.
Revolucionário, porque poético.
Quero deixar, neste depoimento, palavras de Dema que extraio de seu texto de
teatro “A Tragédia Nua de Maria Rosa”: “O
gesto poético é o que fica”.
Depoimento: Marisa
Calheiros Alvarenga, julho de 2011.